Louis XIV

Este fim-de-semana foi dedicado, parte dele, a Luis XIV. Muitos pensarão que dedicar somente um dia ao Rei Sol será, pelo menos, uma afronta a magnânime existência. Talvez. Por cá achámos que baste. Não pela falta de qualidade do jogo, disso não padece, padece sim, ou antes, parece sim, um pouco enfadonho. No bom sentido, claro. Porque nestas coisas, até o enfadonho terá um bom sentido…

Na verdade, a corte de Louis XIV sempre foi algo que me entusiasmou. Não sei se pelas imensas histórias que se vêem na indústria de cinema de Hollywood, algumas delas, de belíssimo recorte técnico-táctico, sendo o adjectivo técnico dedicado à película, e táctico, às manobras de bastidores que naquela corte pareciam existir com bastante sucesso, ou antes, pelos relacionamentos poligâmicos que daí nos contam. Eu confesso! Fascina-me o sucesso da poligamia. Tenho, necessariamente, de sublinhar a palavra sucesso. Não me fascina a poligamia, fascina-me o sucesso da poligamia. Coisas diferentes.

E o retrato deste jogo é o espírito da corte de Louis XIV. Várias personagens, umas mais, outras menos, importantes, de onde nós, digamos, influenciadores de opinião, retiramos os nossos favores para chegar ao nosso objectivo: ser o tipo mais procurado pelos favores que pode fazer aos outros, através do poder que atingiu. Rudiger Dorn (Goa) bem podia ter-se inspirado no calciocaos para escrever este jogo. Não fora este, um título do já extinto ano da graça de 2005 e eu quase que apostava uma jantarada de meeples com cerveja, em como foi em Itália que ele se inspirou. Mas adiante…

Cada um dos jogadores, jogando cartas de personalidades, tenta, através de um processo difícil de organizar estrategicamente, colocar os seus marcadores nos diferentes doze tabuleiros que, em espiral, organizam o jogo. Não é fácil, visualmente, lidar com a espiral, nem é fácil contornar o facto de termos poucos marcadores na reserva pessoal e poucos movimentos de tabuleiro para tabuleiro. Nada disso é fácil de gerir. Parece, aliás, ser a componente mais gira de Louis XIV. Toda a forma como nos vamos envolvendo pelos tabuleiros, saltando de um para outro, tentando, com movimentações máximas de três espaços, atingir os nossos objectivos, como que espreitando todas as oportunidades para sermos o primeiro classificado neste ou naquele tile (tabuleiro), que nos irá dar este ou aquele prémio para, no fim do nosso turno, podermos completar esta carta de missão que temos na mão e que, no final do jogo, nos vai dar os pontos vitória que nós precisamos se o quisermos vencer.

Nesta fase, Louis XIV é muito interessante. Denso, com decisões muito difíceis de tomar, cheio de movimentos tácticos, gerir os nossos marcadores, conquistar maiorias, olhar para o dinheiro para saber se podemos comprar favores, espreitar o número de cartas de influência que os adversários ainda vão poder jogar, tudo isto torna o jogo, neste domínio, muito bom.

Mas é nesta fase também, que o jogo se torna maçador. E é uma pena. Porque há, de facto, interacção entre os jogadores, todos estão muito envolvidos, mas a decisão da carta a jogar no nosso turno passa muito, talvez demais, pela última carta jogada. Ou seja, atrapalha a estratégia, sai vencedora a táctica. Nada de mal, até aqui. O problema maior é estarmos todos muito tempo à espera de jogar sem podermos fazer nada. Só depois de vermos a carta que o jogador antes de nós lançou para a corte é que podemos fazer a melhor jogada possível no nosso turno.

Aqui sublinha-se o defeito. Torna-se enfadonho. Mas o problema é humano, não é material. Ou seja, o jogo só se torna enfadonho porque é, de facto, um jogo que exige muita reflexão e empenhamento e, portanto, daí resulta uma análise mais cuidada e demorada. Não dá para jogar rápido. Como não dá para jogar rápido e cada jogador tem de esperar que o outro termine para “atacar as peles”, é incontornável este defeito. Pela dificuldade, não se pode exigir a ninguém que acelere o processamento da jogada. Mas também não se pode apontar este, como sendo um defeito natural, material, do jogo. Não é justo para o autor, nem para o próprio jogo.

Muitos utilizadores consideram este, o melhor jogo de 2005. Outros, alguns deles os mesmos, consideram esta a obra-prima de Rudiger Dorn. Não posso concordar nem discordar, por não ter bases suficientes para o fazer, mas posso afiançar que Louis XIV é um bom jogo, muito difícil de gerir, muito bonito (lá nisso o sacana é bonito), tem uma originalidade tremenda no sistema de rotatividade dos tabuleiros, fazendo o jogo mudar ao longo do próprio jogo, e uma temática muito bem explorada. Curiosa a forma como os favores que se vão conseguindo ao longo do jogo, terem que ver com acções reais de personalidades reais que tiveram, de facto, essa influência, ao longo do reinado de Louis XIV.

Material: 3/3 Interacção: 2/3 Mecânica: 2/3 Tema: 3/3 Estratégia: 2/3 Tempo/Diversão: 1/3 Regras: 2/2

Classificação: 15/20

Paulo Soledade